02/09/2024

Reforma Tributária de 2023. Parte 17 – Regimes Diferenciados de Tributação

Introdução.

Chegamos ao final desta coletânea de estudos trazendo um tema pendente de muitos debates: o disciplinamento dos regimes diferenciados de tributação do IBS e da CBS, com escopo em cargas minoradas dos tributos. Isto porque o assunto é, por assim dizer, muito sensível aos olhos dos setores econômicos potencialmente contempláveis com os benefícios, de modo que, não obstante os marcos jurídicos fincados pela EC 132/2023, ainda há espaço para penetração de outras atividades nestes regimes, a serem acordadas durante as discussões no parlamento brasileiro.

No instante em que finalizamos este texto (final de agosto de 2024), já há notícias de que a alíquota referência estará bem perto de 28%, portanto superior àquela adotada na Hungria, tida como a maior existente para o IVA. E isso decorre do fato de novas hipóteses de bens e serviços passarem a ter cargas tributárias diminuídas, tirando arrecadação potencial dos sujeitos ativos, o que, para compensar, força o aumento da alíquota padrão.[1]  

Apesar destes senões, o objetivo ora concebido consiste em fazer uma análise constitucional primeira, comentar cada atividade bafejada com o benefício fiscal e fazer rápidos comentários a partir do texto do PLC 68/2024. Preferimos assim proceder porque quando se fala em incentivos fiscais, muitos pontos podem ser modificados, enquanto não chega a aprovação do conteúdo final da lei complementar.[2]

Em face do IBS e da CBS, o constituinte reformista separou as cargas tributárias diminuídas por grupos de atividades, vale dizer, aquelas que desfrutam de redução de 30% da alíquota, aquelas que desfrutam de redução de 60% da alíquota e aquelas que estão completamente desoneradas de tributação.

Já o proponente da lei complementar optou em destacar, em Anexos, as atividades beneficiadas, acompanhadas da nomenclatura oficial correspondente, disciplinando em capítulos e dispositivos específicos o modus operandi de cada regime.

Arriscando uma definição, considera-se regimes diferenciados de tributação do IBS e da CBS o tratamento normativo que impute carga mitigada a determinadas operações, serviços e situações pensadas pelo legislador reformista, levando a efeito peculiaridades econômicas que justifiquem uma imputação tributária menor, inclusive para beneficiar a própria população.

Aspectos Constitucionais.

Seguindo a lógica de que a nacionalização da lei do IBS (a CBS já é federal) tem o intuito de evitar que os estados e municípios criem proteções tributárias locais para atrair investimentos em seus territórios, o constituinte reformista determinou que os regimes diferenciados sejam uniformes em todo o país.

Não esqueceu, por outro lado, de fazer uma advertência de viés financeiro, ao assinalar que, como tais regimes de tributação mitigada impactarão negativamente nas receitas dos entes federados, deverão ser feitos os ajustes – para mais -  nas alíquotas de referência, no intuito de compensar as perdas de arrecadação.

O autor da EC 132/2023 também entregou ao legislador complementar a responsabilidade de definir as operações beneficiadas com a redução de 60% das alíquotas dos dois tributos em pauta, nomeadamente as seguintes, ipsis litteris: 1. Serviços de educação; 2. Serviços de saúde; 3. Dispositivos médicos; 4. Dispositivos de acessibilidade para pessoas com deficiência; 5. Medicamentos (além das composições para nutrição enteral ou parenteral e as composições especiais e fórmulas nutricionais destinadas às pessoas com erros inatos do metabolismo); 6. Produtos de cuidados básicos à saúde menstrual; 7. Serviços de transporte público coletivo de passageiros rodoviário e metroviário de caráter urbano, semiurbano e metropolitano; 8. Alimentos destinados ao consumo humano (inclusive os sucos naturais sem adição de açúcares e conservantes); 9. Produtos de higiene pessoal e limpeza majoritariamente consumidos por famílias de baixa renda; 10. Produtos agropecuários, aquícolas, pesqueiros, florestais e extrativistas vegetais in natura; 11. Insumos agropecuários e aquícolas; 12. Produções artísticas, culturais, de eventos, jornalísticas e audiovisuais nacionais, atividades desportivas e comunicação institucional; 13. Bens e serviços relacionados a soberania e segurança nacional, segurança da informação e segurança cibernética.

Por sua vez, encarregou-se de adiantar que tal percentual não poderá ser alterado em hipótese alguma. Pela regra constitucional, não haverá a incidência do Imposto Seletivo (IS) para estes casos.

No que diz respeito à desoneração total dos dois tributos, seja pela via da isenção, seja pela via da redução a zero das alíquotas correspondentes, o constituinte derivado autorizou o autor da lei complementar a regular algumas situações de caráter social relevante.

A começar por prever isenção nos os serviços de transporte público coletivo de passageiros rodoviário e metroviário de caráter urbano, semiurbano e metropolitano. Logo, são serviços voltados prioritariamente ao deslocamento da população de baixa renda, de sorte que soa de bom alvitre não onerar as tarifas com tributos.

Autorizou também retirar-se totalmente a carga tributária para: a) dispositivos médicos; b) dispositivos de acessibilidade para pessoas com deficiência; c) medicamentos; d) produtos de cuidados básicos à saúde menstrual. Todos relacionados à saúde da pessoa, portanto. E as hipóteses a seguir, igualmente válida para os dois tributos: i) produtos hortícolas, frutas e ovos); ii) serviços prestados por Instituição Científica, Tecnológica e de Inovação (ICT) sem fins lucrativos; iii) automóveis de passageiros, conforme critérios e requisitos estabelecidos em lei complementar, quando adquiridos por pessoas com deficiência e pessoas com transtorno do espectro autista, diretamente ou por intermédio de seu representante legal ou por motoristas profissionais, nos termos de lei complementar, que destinem o automóvel à utilização na categoria de aluguel (táxi)[3].

Particularmente para a CBS, cogitou da redução em 100% da alíquota para serviços de educação de ensino superior nos termos do Programa Universidade para Todos (Prouni), criado pela Lei nº 11.096/2005. Esta é a única exceção prevista para o regime diferenciado só atingir a contribuição federal, não se aplicando ao IBS.

E deixou a alternativa do autor da lei complementar isentar ou reduzir em até 100% as alíquotas dos dois tributos referidos para as atividades de reabilitação urbana de zonas históricas e de áreas críticas de recuperação e reconversão urbanística.

Por fim, o constituinte deixou o autor da lei complementar determinar as situações jurídicas beneficiadas com redução de 30% das alíquotas dos dois tributos no que tange à prestação de serviços de profissão intelectual, de natureza científica, literária ou artística, conquanto sejam fiscalizadas pelo conselho profissional competente.

Vale lembrar que o tratamento dado ao produtor rural e a concessão de créditos presumidos constaram em outra parte do presente estudo, publicada anteriormente.

Análise finalística de cada uma das atividades.

Iremos a partir de agora procurar a teleologia pensada pelo constituinte para que tais atividades merecessem tratamento tributário favorecido.

Antes, porém, cumpre advertir que a citação de alguns casos não dispensa o leitor de, querendo saber exatamente a descrição dos produtos contemplados com o benefício e respectivas classificações fiscais, proceda à consulta do Anexo correspondente no PLC 68/2024. Logo, os exemplos são meramente ilustrativos, apesar de subliminarmente trazerem mensagens importantes.

Produtos direcionados para a alimentação humana

Além dos produtos hortícolas, ovos e frutas, outros alimentos foram contemplados com a tributação minorada. Claro que o objetivo do legislador foi o de minimizar os preços praticados para venda de tais mercadorias, no sentido de facilitar o acesso por parte da população brasileira, especialmente os segmentos de baixo poder aquisitivo.

Há previsão no projeto de lei complementar para alguns derivados do leite, tipos de feijão, carnes, cocos, cafés, variedades de óleos e farinhas, açúcares e pães. Menção a alguns tipos de queijo, em tese tidos como de consumo não popular. Foram relacionados outros alimentos particularmente curiosos, passando de crustáceos (excetos lagostas e lagostim) a mel, mates a polpas de frutas

Dispositivos médicos.

Em condições de normalidade, o indivíduo zela pela sua saúde, direito que conta com tutela especial por parte do estado brasileiro. Nesta direção, o legislador reformista preocupou-se em aliviar a tributação para certos dispositivos médicos, dada a sua importância em proporcionar qualidade de vida para os pacientes. Há no projeto indicação para as próteses, os tomógrafos computadorizados, os respiradores e os aparelhos de ultrassom, além dos marcapassos, os rins artificiais e os stents.

Dispositivos de acessibilidade para pessoas com deficiência.

Até intuitivamente tais bens devem estar gravados com tributação minorada. São dispositivos que servem para conferir melhores condições de vida para os portadores de deficiência. No projeto há referências para as cadeiras de rodas, dispositivos a serem acoplados em veículos automotores e os utilizáveis por indivíduos com problemas de visão e audição.

Composições para nutrição enteral ou parenteral e composições especiais e fórmulas nutricionais destinadas às pessoas com erros inatos do metabolismo.

Aqui estão os produtos de enorme relevância para ajudarem os indivíduos que sofrem de problemas de metabolismo e que tanto precisam consumi-los.

Consoante a literatura especializada[4], “o metabolismo é um conjunto de processos bioquímicos e fisiológicos que ocorrem no nosso organismo para manter a vida. Ele é responsável pela transformação dos alimentos em energia, que é utilizada para sustentar as funções vitais do corpo, como a respiração, a circulação sanguínea, a regulação da temperatura e a manutenção dos órgãos. Portanto, é um processo essencial para a sobrevivência humana e desempenha um papel crucial na manutenção do peso corporal e na saúde em geral”.

Medicamentos.

Trilhando a mesma lógica adotada para os dispositivos médicos e as composições terapêuticas, o legislador reformista também conferiu tratamento diferenciado para os medicamentos. Para a nossa felicidade, a medicina progrediu muito nos últimos anos e cresce em progressão exponencial, sobretudo após o advento da Inteligência Artificial. Consumir remédios é fundamental para o bem viver, de sorte que de nada valeria o avanço da ciência se tais mercadorias estivessem inacessíveis por parte do grande público. Quer dizer: de nada adiantaria se o homem oferecesse cura e tratamento pela via dos medicamentos e o seu semelhante não pudesse usá-los em virtude dos seus altos preços. O produto deixaria de ser um bem essencial para se transformar num bem de luxo, o que seria revoltante. Daí os remédios contarem com reduções de alíquotas. Neste espectro, destaque-se os soros e vacinas.[5]

Serviços de saúde.

Seguindo a mesma linha de fundamentação aplicada aos medicamentos, dispositivos médicos e composições terapêuticas, os serviços de saúde figuram no rol das atividades com tributação diminuída.

Entre os menos conhecidos, faça-se menção aos serviços de bancos de material biológico humano e serviços de optometria.

Faça-se encômios aos serviços de cuidado e assistência a idosos e pessoas com deficiência em unidades de acolhimento: dentro da preservação da saúde como prioridade na política fiscal, tais serviços assistenciais ganham substancial relevo, na proporção direta do crescimento dos cidadãos da terceira idade na pirâmide etária brasileira.

Serviços de educação.

Embora na prática o cenário seja bem diferente, haja vista a pauperização cultural da sociedade, a educação do povo brasileiro também conta com a tutela especial tributária. Cidadão educado é cidadão consciente, culto, crítico e evoluído. Sobretudo politizado. Nesta direção, os serviços de educação usufruem do tratamento tributário diferenciado, conforme tabela anexa ao PLC 68/2024, seguindo a classificação da NBS[6]. Ressalte-se as atividades a seguir: a) ensino de sistemas linguísticos de natureza visomotora e de escrita tátil; b) ensino de línguas nativas de povos originários; c) educação especial destinada a pessoas com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação, observadas as condições ali estabelecidas. Evidente que o legislador desejou propiciar para a população um serviço de educação menos custoso, além de prestigiar determinados ensinamentos voltados para instruir grupos sociais minoritários – e necessitados.

7. Serviços de transporte público coletivo de passageiros rodoviário e metroviário de caráter urbano, semiurbano e metropolitano.

O autor do PLC 68/2024 optou pela isenção dos serviços de transporte público coletivo de passageiros rodoviário e metroviário de caráter urbano, semiurbano e metropolitano, submetidos ao regime jurídico de autorização, permissão ou concessão pública. O transporte público é necessidade proeminente do cidadão brasileiro, notadamente aqueles de pouco poder aquisitivo, a ponto das tarifas serem objeto de constante preocupação por parte das autoridades constituídas.[7]

 

Produtos de higiene pessoal e de limpeza consumidos preponderantemente por famílias de baixa renda.

Está provado cientificamente que o ser humano para ter saúde mental precisa ter cuidados básicos na higiene pessoal e viver em ambientes limpos e salubres. Muitas vezes as camadas economicamente menos favorecidas despendem um esforço enorme para adquirirem bens que possuam esta finalidade. O constituinte derivado percebeu esta necessidade e criou a possibilidade de reduzir a tributação para determinados produtos. Há no PLC 68/2024 referências a sabões de toucador, dentrifícios, escovas de dente, papéis higiênicos, águas sanitárias e sabões em barra, identificados com as respectivas NCMs.[8]

Produtos de cuidados básicos à saúde menstrual.

Tema muito caro às mulheres de modo geral, especialmente aquelas situadas nas classes econômicas menos favorecidas, o autor da EC 132/2023 resolveu agraciar com incentivos fiscais os produtos voltados para a assepsia básica ligados à saúde menstrual. Nada mais justo e consonante com o princípio da dignidade da pessoa humana.

Compulsando-se o texto do PLC 68/2024, vemos que contam com a redução de carga os tampões, absorventes e coletores menstruais, com classificação fiscal ali estabelecida.

Produtos agropecuários, aquícolas, pesqueiros, florestais, extrativistas vegetais in natura (1) e Insumos agropecuários e aquícolas (2).

Embora destacados separadamente pelo autor da EC 132/2023 (art. 9º, §1º, incisos X e XI), os bens em referência possuem finalidade similar. Ambos buscam fomentar o setor primário brasileiro, com intensa vocação exportadora, e que tanto auxilia na balança comercial do comércio exterior. A carga reduzida contribui para o chamado “custo Brasil”.

Dentre eles, como nota de curiosidade, há ressalto para as mudas de plantas, cascas trituradas de coco, aves de um dia (exceto as ornamentais), girinos e alevinos.

Produções artísticas, culturais, de eventos, jornalísticas e audiovisuais nacionais, atividades desportivas e comunicação institucional.

Quanto às produções nacionais propriamente ditas, verifica-se no PLC 68/2024 disciplina sobre o assunto. Indubitavelmente, o objetivo aqui é estimular a criatividade nacional, do ponto de vista das produções, em várias áreas do conhecimento. Encaixam-se aqui as cessões temporárias e os licenciamentos de direitos nos campos artístico, cultural, de eventos, jornalístico e de audiovisual. Os serviços de museus estão igualmente contemplados.

Quanto às atividades desportivas e comunicação institucional, também há regulação por parte do autor do PLC 68/2024, em seções separadas. O esporte – e as atividades a ele correlatas - merece ser incentivado como ferramenta de inclusão social.

A comunicação institucional tem a tributação reduzida quando for prestado para a administração pública direta, autarquias e fundações públicas. Quando o serviço for prestado para destinatários diferentes destes, a tributação dos dois tributos será sem benefício fiscal. A tributação mitigada na comunicação institucional busca baratear os serviços que sejam tomados pela administração pública.[9]

As atividades desportivas contam com a carga reduzida quando envolverem: i) fornecimento de serviço de educação desportiva, classificado no código 1.2205.12.00 da NBS; ii) gestão e exploração do desporto por associações e clubes esportivos filiados ao órgão estadual ou federal responsável pela coordenação dos desportos, inclusive por meio de venda de ingressos para eventos desportivos, fornecimento oneroso ou não de bens e serviços, inclusive ingressos, por meio de programas de sócio-torcedor, cessão dos direitos desportivos dos atletas e transferência de atletas para outra entidade desportiva ou seu retorno à atividade em outra entidade desportiva. No mínimo percebemos a necessidade de aprimoramento da redação do texto de lei para deixar mais clara as subsunções contidas na norma.

Bens e serviços relacionados a soberania e segurança nacional, segurança da informação e segurança cibernética.

Neste quadro estão os bens e serviços considerados estratégicos para o estado brasileiro, não só do ponto de vista militar (a exemplo de torpedos, minas marítimas, radares, foguetes, embarcações e aeronaves de guerra, conforme se retira do texto do PLC 68/2024), como também do ponto de vista da segurança de informação e cibernética.

Também no particular a desoneração completa de tais bens e serviços seria bem-vinda, dada a sua importância para o exercício da soberania nacional e da própria existência do Estado brasileiro, prioridade que supera até os interesses arrecadatórios.

Profissões intelectuais fiscalizadas pelos Conselhos competentes.

O autor da EC 132/2023 atribuiu à lei complementar a missão de determinar quais profissões intelectuais (de natureza científica, literária ou artística) receberiam a tributação do IBS e da CBS minorada, desde que sejam monitoradas pelo conselho profissional correspondente.

Tal foi feito no PLP 68/2024. São elas: I - administradores; II - advogados; III - arquitetos e urbanistas; IV - assistentes sociais; V - bibliotecários; VI - biólogos; VII - contabilistas; VIII - economistas; IX - economistas domésticos; X - profissionais de educação física; XI - engenheiros e agrônomos; XII - estatísticos; XIII - médicos veterinários e zootecnistas; XIV - museólogos; XV - químicos; XVI - profissionais de relações públicas; XVII - técnicos industriais; e XVIII - técnicos agrícolas.

Reivindicação efetuada – e acolhida - pelos profissionais liberais que, não obstante a concessão do regime diferenciado, passarão teoricamente a suportar uma carga tributária bem superior àquela em regra aplicável para o ISS. Para fins de comparação, resta ver na prática como o regime vai funcionar. Por seu turno, não será surpresa se outras profissões forem admitidas pelos senadores como beneficiárias do regime favorecido.

Atividades de reabilitação urbanística.

Também desfrutam da redução da alíquota dos dois tributos as atividades de reabilitação urbana de zonas históricas e de áreas críticas de recuperação e reconversão urbanística. Evidentemente, o intuito aqui foi fomentar a recuperação para preservação do patrimônio histórico do país, além de dar novo direcionamento para as finalidades urbanísticas degradadas, inclusive para evitar a disseminação de áreas abandonadas e suscetíveis ao alastramento da marginalidade.

Segundo o autor do PLC 68/2024, tais atividades têm como intuito a preservação patrimonial, a qualificação de espaços públicos, a recuperação de áreas habitacionais, a restauração de imóveis e melhorias na infraestrutura urbana e de mobilidade.

Automóveis de passageiros para usuários específicos (inclusive taxi).

Conforme o PLC 68/2024, contam com redução a zero das alíquotas dos dois tributos as vendas de automóveis de passageiros de fabricação nacional, atendidos determinados requisitos, quando adquiridos: i) por motoristas profissionais que exerçam, comprovadamente, em automóvel de sua propriedade, atividade de condutor autônomo de passageiros, na condição de titular de autorização, permissão ou concessão do poder público, e que destinem o automóvel à utilização na categoria de aluguel (táxi); ii) por pessoas (ou por seu representante legal) com: a) deficiência física, visual ou auditiva; b) deficiência mental severa ou profunda; ou c) transtorno do espectro autista, com prejuízos na comunicação social e em padrões restritos ou repetitivos de comportamento de nível moderado ou grave.

Trata-se de atividades que, tradicionalmente, em algum momento e espaço, desfrutavam de favores fiscais na área do IPI e do ICMS. O legislador reformista decidiu estender a vantagem para o IBS e a CBS. A categoria dos taxistas possui relevância para a população, pois exerce função auxiliar nos deslocamentos urbanos. As pessoas portadoras de deficiência, em face da vida sacrificada que enfrentam, com dificuldades que em certo grau interferem na sua locomoção, acabaram sendo beneficiários do regime diferenciado.

ICT - Instituição Científica, Tecnológica e de Inovação sem fins lucrativos.

A prestação de serviços de pesquisa e desenvolvimento promovida por ICT sem fins lucrativos, atendidas as condições impostas no PLC 68/2024, desfruta de redução a zero das alíquotas dos dois tributos quando destinada para a administração pública direta, autarquias e fundações públicas ou para contribuinte sujeito ao regime regular do IBS e da CBS.

Reside aqui a adoção de medidas visando animar a atividade de pesquisa e o desenvolvimento, setores tão carentes de estímulos no país.

Prouni - Programa Universidade para Todos.

O constituinte previu só para a CBS diminuição em 100% da alíquota para serviços de educação de ensino superior, nos termos do Programa Universidade para Todos (Prouni), criado pela Lei nº 11.096/2005.

Nesta direção, o PLC 68/2024 implantou o incentivo federal no fornecimento de serviços de educação de ensino superior por instituição privada de ensino, com ou sem fins lucrativos, durante o período de adesão e vinculação ao Programa Universidade para Todos – Prouni.

Este é um benefício derivativo relacionado aos serviços de educação, pelos mesmos motivos já anteriormente explicitados.

Considerações finais.

Esta parte 17 encerra o estudo acerca da reforma tributária relacionada ao consumo de bens e serviços, compreendido também alguns direitos, à luz do estágio atual da EC 132/2023 e dos projetos de lei complementar, estes últimos ainda em tramitação no Congresso Nacional.

No que tange às iniciativas legislativas infraconstitucionais, muito provavelmente testemunharemos mudanças significativas promovidas pelos senadores, de sorte que o conteúdo deste estudo será atualizado – e aprofundado - numa outra oportunidade.

Foram semanas de veiculação de textos que serviram não só para apresentar tema tão complexo para os operadores e interessados no direito tributário, como também no sentido de desfiar argumentos jurídicos que começam a acusar injuridicidades, inconsistências ou necessidades de aprimoramento de alguns dispositivos aprovados.

Por conseguinte, o nosso intento foi apenas lançar luzes adicionais a questões que certamente ocuparão as barras dos tribunais administrativos e judiciais em curto espaço de tempo.

Reconhecemos o esforço enorme que os protagonistas (e não foram poucos) da reforma despenderam para entregar à sociedade brasileira uma proposta consolidada, cujo modelo de tributação espelha a modernidade da tributação do consumo e que, ao mesmo tempo, visou atender às peculiaridades da nossa república e da nossa forma federativa de estado.

O trabalho não terminou. Passos seguintes serão a regulamentação do IBS e da CBS, a edição de normas infralegais, a organização administrativa para a gestão dos novos tributos.

Por outro lado, avizinha-se a fase dois da reforma, direcionada para a tributação da renda das pessoas físicas e jurídicas, já com informes de que o governo federal prepara a proposta final para submissão ao parlamento brasileiro.

Logo, outros desafios surgirão com a instauração de um novo sistema tributário nacional, ora em construção. Muito haverá por pesquisar – e fazer. Neste cenário, só nos resta deixar um brevíssimo recado para todos: voltaremos em breve.

(*) Diretor de Assuntos Fiscais e Tributários do IAF Sindical

(**) Ex-diretor Jurídico do IAf Sindical. Professor de Direito Tributário.


[2] No momento em que este estudo estava sendo elaborado, o texto do projeto foi aprovado pela Câmara e tinha sido encaminhado para apreciação no Senado, de sorte que este tema poderá sofrer ainda mudanças significativas.

[3] Vale registrar que inexiste vedação constitucional para se cobrar o Imposto Seletivo (IS) nestes casos, em virtude da regra geral de incidência deste tributo sobre tais bens, apesar do autor do PLC 68/2024 adotar redução a zero do IBS e da CBS para os veículos adquiridos nesta condição. Do jeito como está, o veículo de passageiros potencialmente pode ser alcançado pelo imposto seletivo, apesar dos proprietários possuírem uma função social relevante (no caso do taxista) ou estarem em condições de saúde especial que exigem formas mais acessíveis de deslocamento. Resta confiar no legislador infraconstitucional para seguir o bom senso.

[5] Curiosamente, ocupou as rodas de discussões congressuais se mereceria o tratamento mitigado algumas substâncias indicadas para disfunção erétil.

[6] NBS significa Nomenclatura Brasileira de Serviços, Intangíveis e Outras Operações que Produzam Variações no Patrimônio.

[7] Na história recente do Brasil, tivemos movimentos populares de vulto que se iniciaram com protestos contra o aumento das passagens de ônibus coletivos urbanos.

[8] NCM significa Nomenclatura Comum do Mercosul.

[9] É possível questionar o porquê da comunicação institucional beneficiada não se estender para outros setores da economia.

compartilhar notícia

Comentários

Gostaria de dar sua opinião sobre o assunto? Preencha os campos abaixo e participe da discussão