O Efeito Reverso no Aumento do IOF
Ângelo Pitombo (*)
O Congresso Nacional, por meio do Decreto Legislativo nº 176/2025, suspendeu, no dia 25 de junho deste ano, os efeitos do decreto presidencial que modificava as regras e elevava as alíquotas de cobrança do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF). Tal medida legislativa encontra respaldo no art. 49, inciso V, da Constituição Federal, que confere ao Congresso a competência exclusiva para sustar atos normativos do Poder Executivo que exorbitem os limites do poder regulamentar ou da delegação legislativa recebida.
A controvérsia foi submetida ao Supremo Tribunal Federal por iniciativa de um partido da base governista, sendo que o próprio Poder Executivo ajuizou Ação Declaratória de Constitucionalidade em defesa da validade do decreto. Em decisão publicada em 4 de julho, o ministro relator Alexandre de Moraes determinou a suspensão tanto do decreto presidencial quanto do decreto legislativo, mantendo provisoriamente as alíquotas anteriores do IOF. A decisão do ministro sobre a questão ocorrerá em data ainda indefinida, após a audiência de conciliação marcada para o dia 15 deste mês.
O IOF, como se sabe, incide sobre operações de crédito, câmbio, seguros e valores mobiliários. Originalmente concebido como instrumento de política monetária, com função regulatória e extrafiscal, o emprego do aludido tributo como instrumento arrecadatório, em desacordo com sua função precípua, constitui grave distorção do ordenamento tributário consagrado pela Constituição.
A majoração da carga tributária incidente sobre esse tributo eleva o custo efetivo do crédito, que já se encontra pressionado por uma taxa de juros próxima de 15% ao ano. Esse encarecimento compromete diretamente as condições de financiamento ao consumo e à atividade produtiva. Ao tornar o crédito menos acessível, restringe-se o acesso a instrumentos de financiamento essenciais para famílias e empresas.
No setor produtivo, o impacto é ainda mais sensível entre as pequenas e médias empresas, que dependem dessas operações para financiar o capital de giro e a aquisição de estoques, situação agravada quando estão submetidas ao financiamento da antecipação tributária. Já para o consumidor final, o aumento do IOF desestimula o parcelamento de compras, freando o consumo de bens e serviços, em sentido contrário à política pretendida de estímulo ao crédito e à expansão do consumo.
Essa retração do consumo impacta negativamente a atividade econômica, resultando na diminuição da arrecadação de tributos como ICMS, ISS, IPI, PIS e Cofins. Vale destacar que a totalidade da receita gerada pelo IOF é destinada exclusivamente à União, ao contrário de tributos arrecadados diretamente pelos demais entes federativos, como o ICMS, o IPVA e o ISS, cuja arrecadação tende a cair nesse cenário.
Do ponto de vista jurídico, há outro aspecto a se considerar. Ao utilizar o decreto presidencial como instrumento para majorar alíquotas com objetivo puramente arrecadatório, o Executivo se afasta da finalidade extrafiscal que legitima a flexibilização da anterioridade, em sua função regulatória, e da legalidade, no que tange à alteração de alíquotas por decreto. A medida passa a indicar desvio de finalidade, violando princípios da legalidade, da segurança jurídica e da capacidade contributiva.
Em síntese, o aumento do IOF com o objetivo de ampliar a arrecadação, além de se afastar da sua finalidade extrafiscal, pode se revelar uma estratégia equivocada, pois essa medida tende a desacelerar a atividade econômica e, consequentemente, reduzir a receita tributária. Sem um estudo aprofundado sobre os impactos das medidas fiscais sobre a atividade econômica, ações desse tipo podem gerar efeitos contrários aos desejados, prejudicando a produção, onerando o consumidor final e minando a confiança na condução da política econômica.
Em vez de mitigar, a medida agrava ainda mais o cenário, como um remédio mal dosado que piora o estado do paciente e afeta todos que com ele compartilham o mesmo ambiente.
(*) Advogado Tributarista, estabelecido em Salvador, Auditor do Estado da Bahia aposentado, Ex-Consultor Técnico na área Fiscal e Tributária do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento – PROMAF, Ex-Conselheiro do Contencioso Administrativo Tributário da Bahia (CONSEF), Conselheiro do Conselho de Assuntos Tributários da FECOMERCIO-SP e Professor de Direito Tributário.
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