1.INTRODUÇÃO
A substituição tributária do ICMS prevista na Constituição Federal de 1988, na forma com foi regulamentada pela Lei Complementar n. 87/96, sob a ótica dos princípios tributários tradicionais pode ter a sua constitucionalidade questionada, apesar de estar prevista na alínea b do inciso XII do art. 155, do texto original da Carta Política.
A argüição dessa inconstitucionalidade fundamenta-se no arquétipo tradicional do imposto sobre circulação de mercadorias e de serviços, que tem por fato gerador imputável de obrigação tributária quando da saída da mercadoria ou da efetiva prestação de serviço, enquanto que a substituição tributa fato futuro.
Alicerçado também nos seguintes argumentos: o substituto não tem uma relação jurídico-tributária direta com o fato gerador futuro; o preço da operação subseqüente é presumido; não se observa o princípio da não cumulatividade, bem assim representa um excesso na responsabilização de terceiros, prevista no Código Tributário Nacional.
Deste modo, este trabalho tem por objetivo demonstrar a constitucionalidade da substituição tributária do ICMS, dentro de uma visão hodierna do Direito Tributário e da necessidade da Administração Tributária criar mecanismos mais eficientes no controle e fiscalização na arrecadação dos tributos, em razão da evolução social que se apresenta.
A previsão da possibilidade de substituição tributária regulada por lei complementar no texto original da Carta Política de 1988 já foi um indicativo do novo pensamento do legislador, diante da evolução da sociedade brasileira e globalizada que passaram a exigir novos conceitos jurídico-sócio-econômico.
Além disso, será realizado um breve estudo sobre a substituição tributária subseqüente, conhecida como substituição tributária para frente, com suporte na LC 87/96 e com enfoque primordial à legislação do ICMS do Estado de Sergipe, Decreto 21.400, de 10 de dezembro de 2002, com as alterações posteriores.
A metodologia utilizada foi a pesquisa bibliográfica com fontes secundárias, em autores como Carrazza, Cardoso, e outros.
2. A SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA DO ICMS.
2.1Considerações iniciais
Antes mesmo de se adentrar ao tema é mister que se faça um retrospecto sobre alguns conceitos que devem ser trazidos à memória.
O ICMS – imposto sobre circulação de mercadorias e serviços – tem por fato gerador, tradicionalmente, a saída de mercadorias do estabelecimento empresarial, oriunda de sua venda; ou da prestação de serviços tributadas pelo estado, nos termos do art. 155, II da Constituição Federal brasileira.
Destarte, o contribuinte natural do ICMS é o vendedor da mercadoria ou o prestador do serviço, sujeito passivo dessa obrigação tributária.
Obrigação é o vínculo jurídico pelo qual alguém (sujeito ativo), pode exigir de outrem (sujeito passivo), o cumprimento de uma prestação economicamente apreciável, positiva (dar ou fazer) ou negativa (não fazer). Surge da vontade das partes, da lei ou do ato ilícito. (1)
Assim, pode-se conceituar a obrigação tributária como sendo o vínculo jurídico por força do qual o Estado pode exigir do particular uma prestação positiva ou negativa, nas condições definidas em lei.
Com a ocorrência do fato gerador, surge a relação jurídico-tributária que obriga o sujeito passivo a pagar o tributo (obrigação de dar), que será individualizado através do lançamento, surgindo, então, o crédito tributário.
2.2 Responsabilidade tributária
A responsabilidade pelo cumprimento da obrigação tributária do ICMS, embora não tenho sido definida pela Carta Constitucional e aquele que pode promover essas operações é o comerciante, o industrial e o produtor. O particular que vende um bem móvel seja ele um operário, uma dona de casa, um advogado ou um médico, não se revestem da condição de sujeito passivo de tal obrigação. (2)
Nos artigos 121 a 128 do Código Tributário Nacional, doravante denominado de CTN, estão definidos os critérios de imputação da obrigação tributária ao sujeito passivo. Quanto ao ICMS pode ser o contribuinte, pessoa diretamente ligada à situação que constitua o fato gerador ou um responsável, pessoa que não seja o contribuinte, mas que a lei lhe impõe a obrigação jurídico-tributária.
A Lei 5.172 de 1966, o CTN, em seu artigo 124 estabelece a solidariedade tributária às pessoas que tenham interesse comum com a ocorrência do fato gerador da obrigação principal; ou, ainda, aquelas expressamente designadas por lei.
Numa análise do art. 126 do CTN, há, porém que se elastecer os conceitos de comerciante, industrial e produtor, não se limitando àqueles que estejam juridicamente constituídos como empresário individual ou sociedade empresária, porque a capacidade contributiva independe da capacidade civil da pessoa natural, de sofrer esta de alguma limitação ao exercício daquelas atividades, ou de estar na administração dos seus bens, ou mesmo devidamente inscrita nos órgãos competentes, salvo as exceções do art. 4º. De Lei Complementar 87/97.
O comerciante ou a sociedade de fato, mesmo que execute de forma clandestina e em caráter habitual a mercancia, será considerado sujeito passivo da obrigação tributária do ICMS, caso venha a realizar alguma das atividades mencionadas. (3)
Por outro lado, o art. 128 do CTN vai mais além, ao permitir que a lei atribua responsabilidade tributária expressamente a terceira pessoa que esteja vinculada ao fato gerador, excluindo a responsabilidade do contribuinte original, ou atribuindo-lhe responsabilidade supletiva.
Com base nestes dispositivos legais já se permite a criação da figura da substituição tributária do ICMS, largamente questionada quanto à sua constitucionalidade, o que será objeto de estudo posterior.
2.3 Alicerce jurídico.
Como foi visto a exegese dos artigos 121 a 128 do CTN já possibilitou a criação da figura da substituição tributária do ICMS, quando permitiu que se atribuísse responsabilidade tributária a terceira pessoa que não o contribuinte direto.
A Emenda Constitucional n. 3, de 17 de março de 1993, acrescentou o parágrafo sétimo ao art. 150 da Constituição Federal de 1988, que trata das limitações do poder de tributar da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Assim, tornou definitivo o caminho para a consolidação da substituição tributária em geral, bem como a do ICMS, objeto deste estudo, com a seguinte redação.
Art. 150 – (…)
"§ 7º A lei poderá atribuir a sujeito passivo de obrigação tributária a condição de responsável pelo pagamento de impostos ou contribuição, cujo fato gerador deva ocorrer posteriormente, assegurada a imediata e preferencial restituição da quantia paga, caso não se realize o fato gerador presumido."
Cumpre ressaltar que o texto original da Carta de 1988 já previa a possibilidade da substituição tributária, visto que a alínea b do inciso XII do art. 155, já remetia a possibilidade de criação da substituição tributária, mediante lei complementar.
Mas foi somente em 13 de setembro de 1996 que entrou em vigor a Lei Complementar 87, a partir de então identificada por LC 87/96, introduzindo no mundo jurídico, como reforço, a substituição tributária do ICMS. Esta lei complementar já foi alterada pela LC 114, de 16 de dezembro de 2002, nos artigos. 6º e 7º, seguintes termos:
Art. 6º Lei estadual poderá atribuir a contribuinte do imposto ou a depositário a qualquer título a responsabilidade pelo seu pagamento, hipótese em que assumirá a condição de substituto tributário. (Redação dada pela Lcp 114, de 16.12.2002)
§ 1º A responsabilidade poderá ser atribuída em relação ao imposto incidente sobre uma ou mais operações ou prestações, sejam antecedentes, concomitantes ou subseqüentes, inclusive ao valor decorrente da diferença entre alíquotas interna e interestadual nas operações e prestações que destinem bens e serviços a consumidor final localizado em outro Estado, que seja contribuinte do imposto.
§ 2º A atribuição de responsabilidade dar-se-á em relação a mercadorias, bens ou serviços previstos em lei de cada Estado. (Redação dada pela Lcp 114, de 16.12.2002)
Art. 7º Para efeito de exigência do imposto por substituição tributária, inclui-se, também, como fato gerador do imposto, a entrada de mercadoria ou bem no estabelecimento do adquirente ou em outro por ele indicado.
2.4 Antecipação tributária versus Substituição tributária.
A antecipação tributária do ICMS reporta-se ao pagamento antecipado do imposto pelo sujeito passivo direito, ou seja, o contribuinte, relativo à ocorrência de fato gerador futuro. Verificam-se aqui dois aspectos importantes da doutrina geral dos impostos: o temporal, momento em que o imposto deverá ser recolhido; e o pessoal, quem deverá ser o sujeito passivo da relação jurídico-tributária. (4)
Esses mesmos elementos estão presentes na análise da substituição tributária, tanto o temporal quanto o pessoal. Distingui-se da antecipação no que pertine à pessoa do sujeito passivo, que neste caso este será indireto, ou seja, o responsável tributário, como terceira pessoa que tenha relação direita com o fato gerador.
De modo que se permite concluir que a substituição tributária encarna em si a natureza jurídica de antecipação tributária.
É exatamente esse pensamento que se pode extrair da interpretação do § 7º do art. 150 da CF-88, no momento em que permite atribuir responsabilidade tributária a terceiro, cujo fato gerador venha a ocorrer no futuro, tendo este o direito de ser restituído do contribuinte primário.
2.5 Visão hodierna da substituição tributária.
A maioria dos doutrinadores entende a teor de Roque Carraza, que a substituição tributária para trás coaduna-se com os ditames constitucionais, uma vez que o tributo será recolhido pelo substituto na operação jurídica seguinte. (5)
Como exemplo um supermercado que adquire mercadoria de um artesão. O supermercado emite a nota fiscal de entrada, recolhe o ICMS pela compra e credita-se desse valor por ocasião da venda.
Por outro lado, preleciona que a substituição pra frente padece de constitucionalidade, mesmo diante da EC n. 3/93. A lei deve dar ao substituto a garantia jurídica de que vai ser restituído do imposto.
Porém, esta prática tem se multiplicado, porque é tendência da administração tributária hodierna a tentativa da evasão fiscal. Para tal elege como sujeito passivo da obrigação tributária um substituto como responsável pelo recolhimento do imposto sobre operação futura.
Torna-se mais fácil à administração tributária arrecadar e fiscalizar as grandes industriais fornecedoras de matérias primas ou de mercadorias, do que os pequenos e médios comerciantes pulverizados no seio territorial do Estado.
Frente e este sistema, Carrazza alega que o arquétipo constitucional básico do ICMS esta se quebrando, quando se responsabiliza aquele que não participou do fato gerador imponível no futuro. Pois como foi visto, esse imposto deve incidir no momento da saída da mercadoria do estabelecimento industrial ou comercial.
Na substituição para frente o ICMS já é cobrado por fato futuro presumido. Assim, a indústria vende um automóvel ao seu revendedor e já cobra antecipadamente o ICMS da futura venda que será realizada pelo revendedor.
Obviamente que este procedimento fere de morte o sistema tradicional de tributação do ICMS, sucedâneo do ICM da Constituição de 1967, que por sua vez substituiu o antigo IVA.
Para Carrazza a EC n. 3/93 atropela o princípio da segurança jurídica duplamente: certeza do direito e proibição do arbítrio. Tal princípio, aplicado ao Direito Tributário, exige que o tributo só nasça após a ocorrência efetiva do fato oponível, ou seja, depois da ocorrência real do fato gerador. (6)
Marco Aurélio Greco ao analisar os conceitos de capacidade contributiva em suas formas tradicionais: capacidade financeira a que leva em conta a disponibilidade financeira do contribuinte; capacidade individual a que analisa o contribuinte caso a caso; capacidade presumida a que atribui presunção de capacidade tributária de acordo com os critérios razoáveis fixados em lei, apresenta um novo conceito exposto por Augusto Fantozzi, em que a capacidade contributiva está vinculada ao pressuposto do fato do tributo. (7)
Em relação ao ICMS, o pressuposto do fato é o ciclo econômico da produção até o consumo das mercadorias. Fato gerador é a operação que implique transferência de propriedade ou posse. Fato de exteriorização e a saída da mercadoria ou produto, este último é um forte indicador de que a compra e venda ocorreu. (8)
Com referência à inconstitucionalidade da EC n. 3/93, por ferir uma cláusula pétrea tributária, a da segurança jurídica, com fundamento no § 4º do Art. 60 da CF-88, data vênia não encontro respaldo jurídico para assertiva.
Prova disto está no fato da EC n. 3/93 ter eliminado um imposto de competência dos Municípios, incidente sobre a venda a varejo de combustíveis líquidos e gasosos, exceto o óleo diesel. Se tal providência foi favorável ao contribuinte, não o foi para os Municípios que tiveram diminuída as suas receitas.
Caso o Sistema Tributário Nacional venha a ser tratado como cláusula pétrea, os avanços da sociedade brasileira não poderão ser acompanhados pelo legislador constituinte derivado, fato este que provocaria, sim, uma verdadeira insegurança jurídica.
Encontro respaldo em meus argumentos nas lições de Greco, quando este analisa os três planos de formulação da tese de cláusula pétrea em matéria tributária, o formal o institucional, e o substancial. Em nenhum deles o citado autor constata que a introdução do § 7º ao art. 150 da CF-88 tenha ferido cláusula pétrea e seja inconstitucional. (9)
Além disso, a lei da substituição em momento algum foi aplicada retroativamente. Apenas os fatos geradores surgidos depois de sua vigência é que foram alcançados.
Ao contribuinte substituto foi garantido o direito de ser ressarcido com prontidão do imposto que teve que adiantar.
De igual sorte, o abatimento do imposto gerado na operação presente foi deduzido do imposto que será gerado na operação futura. Na estipulação do preço futuro de venda o substituto deduz o valor do imposto embutido no preço de compra, de modo que não foi ferido o princípio da não-cumulatividade do ICMS.
Tema que se permitiria questionar é a garantia constitucional da devolução da quantia paga a título de substituição tributária, caso o fato presumido não vier a se concretizar, conforme parte final do § 7º do art. 150 da CF-88. Todavia, o Supremo Tribunal Federal decidiu contrariamente à referida devolução de imposto pago a menor, bem como ao pagamento complementar do ICMS.
Na hipótese do preço de venha ser maior ou menor daquele fixado pelas regras fazendárias, decidiu o Supremo Tribunal Federal que não haverá pagamento da diferença, se maior, nem mesmo o substituído receberá de volta a quantia paga em excesso, se a mercadoria ou produto for vendido por preço inferior ao estabelecido, conforme se vê na seguinte decisão.
Tributário, Recurso Ordinário em Mandado de Segurança. Substituição Tributária Progressiva. ICMS, Recolhimento efetivo antecipadamente. Base de cálculo presumida. Valor final de venda inferior ao estabelecido na pauta Fiscal. Restituição indevida. Precedente STF. ADIn nº 1851-4/AL:
I – Em diversos julgados ficou reconhecido o direito do contribuinte á restituição /compensação do imposto recolhido a maior, bastando a comprovação que está submetido ao regime de substituição tributária e que efetuou a venda por preço inferior ao preço previsto na pauta fiscal;
II – Não obstante esta constatação, verifico que o Supremo Tribunal Federal, recentemente, in DJU de 15.05.2002, ao analisar, na ADIn nº 1851-4/AL, a cláusula segunda do Convênio ICMS nº 13/97, declarou sua constitucionalidade, afastando a limitar que suspendia a eficácia do regramento legal em tela;
III – Naquele julgado, o Pretório Excelso entendeu não importar que o tributo tenha sido recolhido a maior ou menor em face do preço pago pelo consumidor final do produto, porquanto, se a base de cálculos é previamente definida em lei, não restaria nenhum interesse jurídico em apurar se correspondeu ela á realidade;
IV – Nesse panorama, passo a adotar a tese do Supremo Tribunal Federal pela vedação da restituição do ICMS quando a operação subseqüente á cobrança do imposto, sob a modalidade de substituição tributária, realizar-se com valor inferior ao recolhido antecipadamente em fase de base de calculo presumida.
V – Submissão ao entendimento jurisprudencial do egrégio Supremo Tribunal Federal, em homenagem á função uniformizadora que tal decisão implica aos Tributos pátrios (ADIn nº 1851-4/AL). VI – Recurso a que se nega provimento. (Ac um da 1ª T do STJ – ROMS 11.927/MG – Rel. Min. Francisco Falcão – j 07/08/2003 – DJU 1 22/09/2003. p 259 – emenda oficial).
No caso do contribuinte substituído vir a encerrar as suas atividades, antes do pedido de baixa, poderá pleitear junto à Administração Fazendária estadual a devolução das quantias pagas do ICMS substituto pago em relação às mercadorias que não foram vendidas e se encontram em seu estoque final, nesse instante. É o que se deduz do art. 47 do regulamento do ICMS sergipano.
Como já se reportou, o texto original da CF-88 previu a possibilidade da lei complementar instituir a substituição tributária, art. 155, II, b.
A aplicação deste permissivo, no dizer de Carrazza, deveria ser com cautela, mas levando-se em conta o arquétipo tributário tradicional do ICMS, ou mesmo do Direito Tributário então vigente. É provável que a intenção do legislador da época não pensasse numa substituição tributária tão ousada quanto à determinada pela inserção do § 7º ao Art. 150, ou mesmo a aprovada pela LC 87/96.
É certo que os fatos sociais evoluem com tal velocidade, que modificam a sociedade em tamanha rapidez impossível de se acompanhada pelo Direito.
Cabe à doutrina e à jurisprudência, em primeiro plano, ajustar as decisões judiciais às novas tendências sociais, até o momento em que a legislação se adapte à nova realidade social.
O Direito Tributário vivencia uma nova etapa. O crescer da sociedade exige normas mais eficazes de combate à sonegação e a evasão fiscais.
A tendência mais moderna volta-se à cobrança do imposto no instante da circulação da moeda, ou seja, quando alguém recebe o preço de alguns tipos de serviços prestados, vê retido em fonte o valor de impostos pelo agente pagador, que não passam de substitutos tributários, tal como já ocorre com o INSS, PIS COFINS e IRPJ.
É com essa nova visão que deve ser vista a substituição tributária do ICMS para frente, não mais como inconstitucionalidade.
Trata-se de novos conceitos em matéria de Direito Tributário, que necessitam ser reavaliados, aceitos e estudados pelos doutrinadores, com o objetivo precípuo de, dentro do hodierno, da modernidade, evitar o abuso do império do Estado.
2.6 Substituição tributária para trás e concomitante.
São três as espécies de substituições tributárias previstas pela legislação e a base de cálculo em cada uma delas está definida no art. 8º da LC 83/97.
A substituição tributária antecedente, ou para trás, como é conhecida, refere-se a fatos geradores ocorridos anteriormente, ou seja, a lei estipula que o tributo será recolhido, pelo responsável tributário – substituto – na operação jurídica seguinte. É este que suporta a carga econômica desta operação jurídica em nome do substituído. (10)
A segunda espécie de substituição tributária é denominada de concomitante. Neste caso o recolhimento do imposto ocorre no mesmo instante em que ocorre o fato gerador, ex vi, no serviço de transporte iniciado no Estado de Sergipe. Atribui-se ao substituto a responsabilidade pela retenção do ICMS quando da contratação de transportadores autônomos.
Nestes dois casos, o art. 8º determina que a base de cálculo seja o valor da operação ou prestação praticado pelo contribuinte substituído.
2.7 A substituição tributária do ICMS para frente.
Por fim, a mais questionadas de todas é a substituição tributária subseqüente, mais conhecida por substituição tributária para frente.
O regime de substituição tributária do ICMS está previsto a partir do art. 675 do Regulamento do ICMS do Estado de Sergipe, Decreto 21.400, de 10 de dezembro de 2002 e alterações posteriores.
A adoção do referido regime é específica para as mercadorias e serviços relacionados no Anexo IX do regulamento e depende da celebração de convênios ou protocolos com as demais unidades da Federação.
A restituição do imposto substituto foi regulada pelo Convênio ICMS 13/97, artigos 676 "a" e 676 "b". O primeiro garante a devolução do imposto caso a operação posterior com as mercadorias ou serviços não se efetivem ou venha ser isenta do mesmo.
Já o art. 676 "b" reproduz o entendimento do STF anteriormente exposto, referente ao não recolhimento de mais imposto, se a mercadoria for vendida por preço maior; nem à devolução do imposto, se vendida por preço inferior ao presumido.
Os artigos 677 a 678 definem quem são as pessoas para as quais pode ser atribuída a responsabilidade de contribuinte substituto, a exemplo do industrial, do produtor, do comerciante, do prestador de serviços de transporte interestadual; intermunicipais ou de comunicações, entre outros.
A base de cálculo esta disciplinada pelo art. 684 do regulamento, em consonância com o art. 8º da LC 87/96.
Nas operações subseqüentes, incluem-se os preços da mercadoria ou do serviço, frete, seguro e demais encargos; a margem de valor agregado, inclusive o lucro, relativa às operações ou prestações subseqüentes.
O responsável substituto para que possa se investir nessa condição deverá realizar a sua inscrição cadastral na Secretaria da Fazenda do Estado de Sergipe. Tal inscrição se reveste de um caráter especial, porque não exige que o substituto mantenha estabelecimento no Estado.
Satisfeita essa exigência, a indústria, o comerciante, o produtor ou o prestador de serviço poderá negociar com as empresas sergipanas, porque estará apto a efetuar do recolhimento do ICMS substituto através da GNRE – Guia Nacional de Recolhimento Estadual e cumprir as demais obrigações acessórias, via internet, por meio do sistema SINTEGRA.
Com o intuito de melhor ilustrar o tema veja-se o exemplo de uma indústria de pneus sediada na cidade do Rio de Janeiro, naquele Estado e vende R$ 100.000,00 deste produto para uma distribuidora em Aracaju. A distribuidora revende esses pneus para os consumidores finais.
O ICMS gerado na venda feita pela distribuidora aos consumidores finais será cobrado e recolhido aos cofres da Fazenda Pública de Sergipe pela indústria do Rio de Janeiro, que substituirá, nesta obrigação fiscal, a distribuidora de Sergipe.
Para atender ao princípio da não-cumulatividade, o valor do ICMS embutido no preço de venda dos pneus pela indústria será abatido do preço de venda presumido para esta operação, do valor a ser pago a título de ICMS substituto.
Observe-se o quadro abaixo:
QUADRO DEMONSTRATIVO:
(1) # Venda da indústria (RJ) para (SE) R$ 100.000,00
(2) # ICMS gerado por esta operação: 7,0 % R$ 7.000,00
(3) # MVA (margem de valor agregado) (11) 30,0% R$ 30.000,00
(4) # TOTAL (1) + (3) (BC 1) R$ 130.000,00
(5) # (BC1) x 17% = ICMS s/revenda R$ 22.100,00
(6) ICMS da Substituição tributária a ser recolhido à (SE) = (05) – (02)
(07) R$ 22.100,00 – (02) 7.000,00 = R$ 15.100,00
Constata-se no exemplo que o valor do ICMS existente no preço de compra das mercadorias foi abatido do ICMS substituto gerado pela operação futura, preservando-se o princípio da não cumulatividade.
Assim, foi exposta uma síntese da operacionalidade do sistema da Substituição Tributária do ICMS para frente no Estado de Sergipe. Maiores detalhes poderão ser vistos na legislação indicada, pois não é o objetivo deste trabalho.
3.Conclusão.
O Imposto sobre circulação de mercadorias e serviços previsto no art. 150, II da Constituição Federal de 1988 tem o seu arquétipo teórico fundamentado no antigo ICM – imposto sobre circulação de mercadorias da Carta Constitucional de 1967, que por sua vez derivou do mais antigo IVA – Imposto sobre valor agregado.
O fato gerador do ICMS é a circulação econômica da mercadoria vendida, que ocorre com a sua saída do estabelecimento industrial ou comercial; ou a prestação de serviços de transportes interestaduais, intermunicipais ou de comunicação.
No arcabouço tradicional deste imposto o sujeito passivo da obrigação tributária surgida com a ocorrência do fato gerador é o contribuinte direto, ou seja, o vendedor da mercadoria ou o prestador de serviços, responsável direto pelo cumprimento da obrigação tributária.
Os artigos 121 a 128 do Código Tributário Nacional definem hipóteses de responsabilização tributárias a terceiras pessoas, in casu, o terceiro diretamente ligado à situação que constitua o fato gerador; ou um terceiro responsável diretamente apontado pela lei.
Entre essas pessoas destaque-se o industrial, o produtor, o comerciante, o prestador de serviços, que não necessita ser pessoa jurídica regularmente inscrita no Registro competente nem nos órgãos tributantes, porque o exercício de fato da atividade mercancia, com habitualidade, é suficiente para atribuir à pessoa responsabilidade tributária.
A substituição tributária tem por natureza jurídica uma espécie de antecipação tributária. Distingue-se dessa porque quem antecipa é o sujeito passivo direto da obrigação tributária, ao passo que naquela o substituto é uma terceira pessoa que se torna responsável pelo recolhimento do imposto, referente a um fato gerador futuro.
Na substituição tributária do ICMS para trás, aquela que o fato gerador ocorreu anteriormente, responsabiliza o substituto pelo imposto quando da ocorrência da operação seguinte; os doutrinadores entendem ser pacífica a sua constitucionalidade.
Assim também entendem para a substituição tributária concomitante, que é comum, nos casos de serviços transportes interestadual, intermunicipais e de comunicações, entre outros.
A polêmica toda é gerada na substituição tributária subseqüente, ou para frente, porque o responsável tributário é uma terceira pessoa que não tem relação jurídica com o fato gerador que vai ocorrer no futuro; o imposto será calculado sobre um preço da mercadoria ou serviço presumido, que poderá não ser o valor real e o princípio da não cumulatividade não será respeitado.
Entendem os doutrinadores que há um exagero da lei na abrangência do conceito de um terceiro responsável pelo imposto.
O objetivo do fisco é facilitar a sua atuação na prevenção da evasão ou elisão fiscal, concentrando a atenção da administração tributária na fiscalização mais direta dos maiores contribuintes e, através deste, dos menores.
De fato, diante da nova realidade social, com o crescer da população e das empresas, bem assim as dificuldades financeiras do Estado para arcar com o custo da administração pública torna-se imperioso a criação de novos mecanismos e novos conceitos no campo do Direito Tributário.
O constituinte de 1988 já vislumbrou um esboço da nova realidade ao prever a possibilidade de substituição tributária do ICMS, regulada por lei complementar, sem dar ao texto constitucional maiores detalhes.
Com base nessa brecha da Constituição os Estados criaram a substituição tributária nos moldes atuais, que teve a sua constitucionalidade acatada pelo Supremo Tribunal Federal, já levando em conta essa nova visão social e jurídica.
Para reforçar esse entendimento o constituinte derivado aproveitou a Emenda Constitucional n. 3/93 e ampliou o conceito de substituição tributária no texto constitucional, com a introdução do § 7º no art. 150, nestes termos:
"§ 7º A lei poderá atribuir a sujeito passivo de obrigação tributária a condição de responsável pelo pagamento de impostos ou contribuição, cujo fato gerador deva ocorrer posteriormente, assegurada a imediata e preferencial restituição da quantia paga, caso não se realize o fato gerador presumido."
Frente a este dispositivo, em 13 de setembro de 1996 entrou em vigor a Lei Complementar 87/96, que tratando do ICMS, veio regulamentar o previsível constitucional da substituição tributária, completando o alicerce jurídico para a sua exigibilidade.
Assim, revela este breve estudo que a substituição tributária encontra respaldo constitucional desde a promulgação da Carta Cidadã de 05 de outubro de 1988, reforçada que foi com a alteração de 1993, pela EC n. 3.
Finalmente foi regulamentada pela Lei complementar n. 87, de 13 de setembro de 1996, que deu suporte às legislações estaduais; tudo isso como corolário de uma nova visão social, política, econômica e tributária exigida pela modernidade.
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Notas
(1) DAUD. Infrações tributárias. Curso de Pós Graduação Latu Senso. UCAN – RJ. 2002. www.professordaud.com.br. Atividades.
(2) CARRAZZA. Roque Antonio. ICMS. 7ª. Ed. Malheiros. São Paulo – 2001. pág. 35.
(3) CARRAZA. Opus cit. Pág. 36.
(4) MELO. Augusto Carlos Cavalcante. A base de cálculo do ICMS na substituição tributária. Revista Tributária e de Finanças Públicas n. 65. Novembro e Dezembro de 2005. Editora RT.
(5) CARRAZZA. ICMS. Opus cit. Pág. 210 e segs.
(6) CARRAZZA. ICMS. Opus cit. Pág. 213.
(7) GRECO. Marco Aurélio. Substituição Tributária (antecipação do fato gerador) Pág. 81. Malheiros. São Paulo: 2001.
(8) GRECO. Ibidem. Pág. 81.
(9) GRECO. Opus cit. Pág. 42.
(10) CARRAZZA. ICMS. Opus. Cit. Pág. 210.
(11) A MVA (margem de valor agregado) corresponde ao lucro bruto que a distribuidora de Sergipe teria ao vender ao consumidor.
(*)Promotor de Justiça do Estado de Sergipe, titular da 14a. Vara Cível de Aracajú, Falências, Concordatas e Precatórias e professor. da Universidade Federal de Sergipe – UFS E da Escola Superior da Magistratura de Sergipe – ESMESE-. Aracaju – SE.
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