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Contos natalinos de um pobre correntista pobre

NOTAS INICIAIS

Após lerem o escrito abaixo, não fiquem com pena de mim ou não me julguem "sangue de barata". Na verdade, poupei vocês ao deixar de registrar os impropérios que desferi a cada vez que vivenciava as desagradáveis experiências adiante relatadas. Além disto, cuidei para que os fatos narrados chegassem à ouvidoria do banco e chegassem ao conhecimento do grande público, sem falar nos preparativos para ser intentada a competente ação judicial de reparação por danos morais e materiais.

Preferi chamar de contos porque a história bem que poderia ser uma ficção, tantos são os fatos inacreditáveis, apesar de ser absolutamente verdadeira, beirando o surrealismo, embora eu tenha me esforçado em dar a ela alguns toques de humor. E como o meu sofrimento aconteceu entre o final de novembro e início de dezembro, nada melhor do que chama-los de "natalinos", por homenagear JESUS CRISTO no mês do seu nascimento, o homem que mais penou nesta face da Terra.

Tudo começou com a decisão do governo de transferir a conta do servidor público estadual para o Banco do Brasil. Talvez por estas e outras tal instituição financeira tenha se tornado a campeã em arrecadação de tarifas bancárias, batendo os seus concorrentes da iniciativa privada, conforme propalado na mídia. Tornei-me contra a minha vontade um correntista desse banco.

Esta é a odisséia de um correntista que tentou resolver seus problemas como qualquer outro cidadão e que, dada a sucessão de absurdos e descalabros, se viu na obrigação de compartilhar as desventuras com vocês.

CAPÍTULO I – LEGALIZAÇÃO DA CONTA CORRENTE E RECEBIMENTO DE SENHA E CARTÕES

Ao saber que passaria a ter conta-corrente no Banco do Brasil, uma onda de ansiedade tomou conta de mim. Eu, um servidor estadual, passaria a fazer parte da vida de uma instituição federal. Estava nesta expectativa quando foi divulgado que a legalização da minha conta seria feita no meu local de trabalho, na própria Secretaria da Fazenda, unidade DAT/Metro, situada na Barros Reis.

Vários adiamentos depois e finalmente o atendimento se iniciaria. Não podia me conter de tanta emoção.

– 1º dia:

Surpreendido por terem aberto a minha conta-salário em Simões Filho (ou terá sido em Aratu?), fui informado que uma equipe inteirinha iria me atender no local de trabalho.

Como disse, o início do atendimento foi adiado várias vezes até que, numa 2ª feira, recebi a senha nº 01 para assinar os contratos, receber os cartões e a senha.

Infelizmente, disseram-me que a "papelada" não tinha chegado e que ?iriam estar providenciando? (que irritante expressão!) o mais rápido possível, pois o responsável ainda visitava as agências com este objetivo.

Voltei pela tarde e tornei a ouvir a mesma antipática expressão, típica do "tele marketês", que inundou o nosso dia-a-dia toda vez que precisamos dos préstimos de uma empresa ou de um órgão público: "vamos estar providenciando…"

– 2º dia:

Já ciente de que a equipe da Barros Reis veio de outros Estados, sem nenhum compromisso de atender bem o servidor público baiano, rumei para o mesmo local e fiquei indignado com a reação de uma das bancárias ao atender um colega. Agindo como se estivesse fazendo um imenso favor, ela disse que os contratos não estavam todos ali porque o banco não tinha a relação dos lotados na Barros Reis.

Intercedi dizendo que a SEFAZ tem um sistema em que se extrai a relação de todos os colegas daquele local e que bastava isto ser solicitado para que todos os dossiês estivessem disponíveis no 1º dia de atendimento. Ela fez "ouvidos mouco"?.

Ao ver o comportamento daquela bancária, transportei-me no tempo para a década de 70, quando funcionários públicos incompetentes e descompromissados com o público emprestavam atendimento de semelhante qualidade. Imaginava que tal estirpe de servidor já tivesse sido extinta há muito tempo…

Quanto ao meu problema … ouvi de novo a odiosa frase antes citada. "Afinal – argumentou uma delas – Simões Filho é longe" e não dava para resolver o problema de uma hora para outra. Como a minha conta é de lá, a 30 km de Salvador, pensei em reservar passagens de avião toda vez que eu precisasse tratar de problemas com o gerente.

Voltei pela tarde e novamente não obtive sucesso. Fui para casa pensando na idéia de que se um banco inicia uma relação com um cliente desta natureza, imagine no futuro quando esta preocupação tende a se degradar.

– 3º dia:

Acordei disposto a dar cabo da pendência a qualquer custo. Fui um dos primeiros a chegar (lembram da senha nº 1?) e, diante de outra negativa, ameacei ir à imprensa, fazer propaganda negativa, até falar com Lula para ver meu problema solucionado.

Desta feita, recebi do coordenador a promessa de que no turno vespertino tudo estaria resolvido.

Quase pulei de alegria quando vi uma das funcionárias sacudir o envelope contendo os meus documentos. Finalmente, sairia de lá com conta oficializada, cartões no bolso e senha para movimentar os valores.

Porém, enorme foi a minha decepção quando me disseram que tudo estava em ordem, exceto a senha, ainda não fornecida. Argumentei que sem a senha meu dinheiro hibernaria um bom tempo, não poderia pagar as contas, fazer supermercado, estas coisas que todos nós mortais fazemos.

Depois de muita pressão, orientaram-me a ir a qualquer agencia do banco, onde eu cadastraria a senha e resolveria de uma vez por todas a pendência.

Saí de lá frustrado, imaginando no que viria na manhã seguinte. Se o prometido atendimento "vip" para os integrantes da SEFAZ era daquela maneira, como seria o prestado para um cidadão que bate as portas de uma agencia qualquer?

– 4º dia:

Eu – que não costumo rezar – despertei fazendo uma oração para todos os santos, torcendo para que o atendimento desprezível daqueles dias fosse um golpe do azar por lidar com uma equipe alienígena e despreparada para atender os fazendários. Afinal, bancário de agência é treinado, atualizado, acostumado a interagir com o público todos os dias.

Escolhi uma agencia de um bairro nobre e parti bem cedinho para a Pituba, cheio de esperança em ser tratado como gente. Em bairro de "barão" – deduzi – deve-se prestar um serviço de qualidade, é para lá que eu vou. Com as costumeiras rotinas de segurança (a incômoda sessão tira chaves, celular, óculos, calculadora, caneta, tira moedas, grampos, clips, cinto, tira calça…oops!), disparei ao encontro daquela máquina de senhas e instalei-me numa sala de apertados lugares, que mais parecia um picadeiro de refugiados.

Ao sair minha senha na tela, meu coração pulou de felicidade; ganhara uma senha para ganhar uma senha, nada podia dar errado agora.

Atendeu-me um tal de Marinho (o nome estava no crachá) que permaneceu com os olhos no computador. Detesto este tipo de gente que trata o próximo como se fosse um fardo, um ser inanimado. Disse a ele que era servidor público estadual e queria a senha para os meus cartões.

Sem tirar os olhos da tela, dito senhor apertou bem umas 200 teclas e esperei longos 5 minutos num silêncio angustiante. Terminada a liturgia, pediu o meu cartão, examinou-o, colocou-o contra a luz e, numa voz metálica, dessas que saem de secretárias eletrônicas, escutei a seguinte frase:

"O senhor só poderá cadastrar a senha na sua agência de origem, o sistema não está preparado para a operação que o senhor quer".

Não acreditava no que ouvia.

Apesar de relatar a minha "via crucis", os dias de suplício que passei, a orientação que recebi do próprio banco, observei do referido robô, ou melhor, senhor, aquele comportamento impassível de quem pouco está se lixando com o meu sofrimento.

Saquei da minha cintura o meu celular (bem que poderia ser outra coisa) e liguei para o coordenador do banco que na véspera havia me orientado a procurar qualquer agência.

Achei um desaforo gastar preciosos reais com o meu telefonema e pedi ao coordenador que ligasse para a agencia e falasse com o Sr. Marinho.

Exigi deste último funcionário que conversasse com o gerente geral e ponderei que eu só sairia dali quando tudo fosse a bom termo. Acompanhei a sua saída por uma porta de acesso restrito e esperei longos, longos 15 minutos. Nem sinal dele nem da ligação do coordenador.

Já arquitetava um plano para fugir daquele local após quebrar os 3 micros da saleta de atendimento, quando pus os olhos no marinho cidadão que, sempre mirando os teclados do computador, veio com as seguintes palavras:

?É, senhor, o senhor tem razão, conversei com o gerente sobre o caso do senhor e este me disse que a rotina mudou mas não foi passada para os demais funcionários. De fato, o senhor pode cadastrar a senha do senhor em qualquer agência?.

"Senhor" demais para respeito de menos.

E ali fiquei durante 20 minutos até que recebi a indigitada senha, mas sem antes ouvir dele as seguintes palavras carregadas de sarcasmo:

"Senhor! Quase a sua "via crucis" continua, hein?"

Bem que este Marinho, por ser marinho, podia estar despachando nas profundezas do Atlântico, pensei comigo mesmo.

CAPÍTULO II – RECEBIMENTO DOS DIVIDENDOS DE AÇÕES DE EMPRESAS TELEFÔNICAS

Antes de ser correntista, costumava todo o final de ano procurar uma agência do banco do brasil para sacar na "boca do caixa" os dividendos distribuídos pelas empresas para os proprietários de linhas telefônicas que adquiriam ações. Dezembro é mês de dinheiro pouco e despesas muitas. O procedimento era simples: apresentava-me ao bancário, entregava o RG e CPF, assinava os recibos de retirada e pronto. Lá saia eu serelepe com a grana para a ceia de Natal.

– 1º dia:

Desta vez, nada iria falhar. Se quando não era correntista, tudo correu bem, imagine agora na condição de cliente, a exibir novinho em folha o meu cartão do ?ourocard?.

Entrei na agência e fui informado de que para tal serviço devia retirar uma senha e aguardar no tal picadeiro de refugiados mencionado anteriormente. Estranhei que num dia potencialmente de pouco movimento houvesse tanta gente ali. Aliás, seja dentro da casa bancária, seja nos quiosques de auto-atendimento espalhados pela cidade, reparei que sempre há uma fila, não importa o dia do mês.

Aguardei pacientemente 70 minutos até que vi na tela que era chegada a minha vez. Disse o que queria, entreguei os documentos de praxe e 150 teclas depois … pimba!

Sem esboçar qualquer constrangimento pelo transtorno, ouvi do indiferente funcionário que o sistema de acesso ao pagamento de dividendos estava "fora do ar".

Maldita explicação do sistema "fora do ar"! Certeira justificativa que não dá a menor chance para o prejudicado contra-argumentar. Livra-se da responsabilidade culpando a máquina. É como se voltássemos para a Idade Média, fossemos acusados de bruxos e condenados à fogueira por desígnio de DEUS. Não há defesa para isso…

Mas não podia me dar de vencido. Ao saber que a situação estava deste jeito desde o início do expediente e que não havia previsão de regularização do acesso naquele dia, argumentei que o banco falhou porque não avisou às pessoas que o sistema estava indisponível para este serviço e que seria prudente voltar no dia seguinte.

Menos pior agir assim do que fazer a pessoa aguardar mais de 1 hora, alimentar a esperança de embolsar a quantia e, no final, receber um infalível, incontestável e covarde NÂO !

Saí frustrado pensando como procedimentos simples como estes são ignorados pelos gestores do banco. Não seria incompetência, com certeza, mas total desatenção à dignidade do brasileiro.

– 2º dia:

Dia novo, velhas senhas, velhas filas, velho desprezo.

Enquanto aguardava a minha vez, notei um detalhe interessante: apesar das dezenas de pessoas na espera, a cada vez que um cliente se levantava da mesa após o atendimento, bons 2 a 3 minutos transcorriam para que um novo número de senha estampasse no visor. Fiz as contas. Com 40 almas na expectativa de serem atendidas, o último da fila teria esperado dolorosos 80 minutos a mais. Um desperdício de 80 minutos, no mínimo! Isto sem contar com os momentos (necessários, é verdade, não sou desumano) em que o bancário se ausenta do local para beber água, ir ao banheiro, tomar um cafezinho ou "bater um papo".

Das duas a uma: ou o sistema que ativava a nova senha era lento e impedia que o atendimento fosse mais rápido ou o ilustre funcionário aproveitava o intervalo para fazer, digamos, uma "cerinha". Ou das duas as duas.

Ritual repetido: senha chamada, bunda sentada, documentos em punho, 250 teclas digitadas e verificou-se que o sistema de pagamento de dividendos estava em condições de uso. Perguntado se eu queria sacar o dinheiro ou depositar na conta, respondi que seria melhor fazer o crédito.

Mais teclas apertadas e, pela enésima vez, a doce ilusão. O meu cadastro era do tipo básico, que não me autorizava a fazer a operação; seria necessário mudar o meu cadastro para o tipo intermediário e isto só seria feito na agência em que eu tinha conta.

"Não, não" – retruquei aflito. "Sendo assim, prefiro ir direto ao caixa".

"O senhor não entendeu" – disse-me o bancário. "Sacando ou depositando, nada pode ser feito enquanto a mudança não for efetivada".

Saudades do tempo em que eu não era correntista, um completo desconhecido para o banco, quando sacar dividendos era tão simples.

Depois de muita insistência, consegui que o bancário encaminhasse um e-mail para a minha agencia de origem. Ficou o compromisso de em 2 ou 3 dias eu retornar para saber se estava tudo regularizado.

– 3º dia:

Na data aprazada, compareci perante o mesmo funcionário e este me disse que a minha agência de origem não tinha respondido a mensagem. Perguntei se ele tinha cobrado uma posição dos seus colegas. "Sinto muito, senhor, temos muitas rotinas a fazer e não temos tempo para cuidar destas coisas…"

¢¥¿Ð?????????????##%%%***!!!!!!!!, resmunguei em voz alta.

Não tinha jeito. Tinha que me deslocar para Simões Filho, até porque havia também a pendência do pagamento do doutorado, conforme vocês saberão a seguir.

CAPÍTULO III – PAGAMENTO DO MEU DOUTRADO NO EXTERIOR

Ao meio desta enxurrada de decepções, alegrei-me em saber que o fato de me impingirem a condição de correntista do banco coincidia com o pagamento da minha primeira semestralidade do doutorado que estou fazendo em Portugal.

Para tanto, seria necessário eu procurar o Sr. Luis Augusto, responsável pelas operações de câmbio e remessas de recursos para o exterior.

– 1º dia:

Estranhei que naquele setor a fila ainda fosse controlada a caneta e papel, pois o interessado anunciava seu nome que era solenemente transcrito numa relação. Estranhar não seria bem o termo, pois naquela altura eu só duvidava que DEUS pecasse.

Hei de reconhecer que excepcionalmente fui chamado em pouco tempo. Também pudera, não havia tanta gente demandando o serviço.

Todavia, a minha intenção não era fazer a remessa naquele momento mas apenas me nutrir de informações para que tudo corresse bem quando eu estivesse com a conta regularizada. Afinal, eu estava naquela fase em que a equipe encarregada de legalizar a conta ainda não havia chegado na Barros Reis, lembram?.

Precavi-me para evitar contra-tempos no futuro.

A principal informação passada foi a de que a remessa só poderia ser feita através de débito em conta-corrente, exigência que achei correta porque visa prevenir remessas escusas efetuadas com capitais obtidos ilegalmente.

– 2º dia:

Regularizada a conta (pelo menos, assim eu julgava, pois eu tinha assinado contratos, recebido os cartões, obtido senha e depositado o valor correspondente à semestralidade) e tomadas as providencias para o pagamento do doutorado, apresentei-me ao encarregado do câmbio e tive o meu nome registrado na lista de chegada.

Algum tempo depois, já na frente dele, perto de ultimar o pagamento, recebi a informação de que a remessa não poderia ser feita enquanto o meu cadastro de correntista não estivesse compatível com a operação de câmbio à qual eu pretendia fazer.

Pela primeira vez, eu tomara ciência de que eu era um correntista, por assim dizer, de terceira categoria, detentor de cadastro do tipo básico, e que necessitava mudá-lo para o tipo intermediário, de segunda categoria.

Insisti em resolver ali o problema e a muito custo referido senhor aquiesceu em voltar a falar comigo, mas só depois que ele estivesse atendido a todos que estivessem na fila. Fui deslocado para uma espécie de "repescagem" de atendimento, rebaixado para a condição de cliente com pendências, ainda que elas não tivessem sido causadas por mim.

Nova rodada de conversas e o Sr. Luis se entendeu com a minha agência de origem na voz do Sr. Raul, que garantiu modificar o cadastro o mais rápido possível.

Naquela oportunidade, escutei do citado senhor a promessa de que, resolvido o problema, teria eu atendimento preferencial, sem precisar entrar de novo na lista de chegada. Pedi o seu numero de telefone e depois de fornecê-lo, o Sr. Luis me disse que não atende telefone em horário de atendimento presencial, em atitude merecedora de aplausos, porque devem ter absoluta prioridade os cidadãos que se dão ao trabalho de se deslocarem até a agência para desatarem suas pendências, permanecendo um bom tempo no aguardo.

Apesar do compromisso de solução da pendenga cadastral, a minha confiança havia se esvaído completamente. Decidi eu mesmo liquidar a questão tratando pessoalmente com a minha agencia. Quem sabe lá eu teria melhor tratamento?

– 3º dia:

Acordei cedo como de costume e após deixar o filho na escola, encarei a perigosa e esburacada BR 324 rumo a Simões Filho.

Estacionei o carro num sol danado e entrei numa agência apinhada de gente na ante-sala. Era dia 5, dia de pagamento. Dirigi-me à porta giratória que dá acesso à agência propriamente dita e avistei um sonolento "segurança" que coçava o dedão do pé pelo buraco da meia. Com má-vontade ele respondeu ao meu chamado, identifiquei-me como correntista, contei o problema e disse que queria falar com o Sr. Raul, a pessoa que tratara do meu caso com o Sr. Luis.

O guarda retornou dizendo que eu esperasse, pois o Sr. Raul me atenderia.

Fiquei postado na porta giratória, os minutos foram passando e eu lá em pé, nutrindo a sensação de que eu seria tratado como mais um chato que iria incomodar a concentração dos nobres bancários antes da abertura do expediente.

Tive a idéia de ligar para ele dali mesmo e assim o fiz. Prestados os devidos esclarecimentos, ele autorizou a minha entrada e finalmente pude contatar pela 1ª vez com alguém que pudesse me dar certa importância, apesar do ?chá de espera? que ele tencionava me servir das 08:30 h até às 10 h.

Nem deixei o Sr. Raul me cumprimentar direito. Despejei todo o rosário de reclamações, insatisfações, críticas, agravos, queixas, lamúrias e altercações, tudo que pudesse dar notas pesadas ao meu relacionamento inicial com o banco.

Enquanto relatava o ocorrido, sentia uma quentura insuportável, digno de chamar o Saara de frigorífico e o capeta de compadre. Ao constatar que o ar condicionado não funcionava, questionei se isto era alguma medida de contenção de despesas. Não era.

A refrigeração não operava há 2 meses e fiquei a imaginar o grau de estresse que devia existir na relação dos clientes com aqueles bancários, todos derretendo de calor.

Alterado o meu cadastro de básico para intermediário, estava eu pronto para voltar a Salvador com o fito de pagar o doutorado.

Ainda ao volante do carro, achava engraçado (melhor revoltante) que em momento nenhum deste calvário recebi de qualquer um dos bancários que contatei um pedido de desculpas, nem mesmo do gerente geral da minha agência.

Transformei-me em correntista compulsório do banco sem ganhar um centavo por isso. Ao contrário, nesta quinzena de amarguras, só fiz perder tempo, ganhar mais cabelos brancos e gastar dinheiro com telefone, estacionamento, combustível etc. etc.

Sem ter outra opção (era dia 5, lembram?), enfrentei num salão escuro e abafado uma fila gigantesca para entrar na agencia, que se contorcia e se misturava a tantas outras que desaguavam nos caixas eletrônicos.

Entrei, apresentei-me ao Sr. Luis e disse-lhe que acabava de chegar de Simões Filho, na esperança de receber atendimento prioritário, conforme garantido na véspera.

Enquanto aguardava, vi um cidadão com voz estridente xingar uma funcionária de prostituta, na versão mais chula do palavrão. Embora censurando aquela atitude, recapitulei tudo que padeci e achei que o cidadão deveria ter lá os seus motivos.

Sessenta minutos depois assentei-me na frente do Sr. Luis e pude verificar que eu era o 8º da fila e que nenhum atendimento preferencial havia sido dado.

Estava lá de corpo e espírito, mas o atendimento não se iniciou. É que, ao contrário de sua afirmativa feita na véspera de que não atendia telefonemas em horário de expediente, pilhei aquele senhor ao celular tratando do mesmo assunto que pelo 3º dia eu tentava resolver, falando com uma espécie de "fura-filas" virtual. Deu-me vontade de arrancar-lhe o aparelho e de jogá-lo na primeira privada (ou será "private"???) que encontrasse.

Não suportava mais tanta descura e exigi dele um pedido de desculpas. Mas desisti logo em seguida. Descobri que pedido de escusas não faz parte da cultura daquela organização. Concluí que a arrogância e o descaso estão internalizados no seu seio, selada (no sentido de selar cavalos mesmo, não de selar cartas) pela falsa mentalidade de "estar fazendo favor" em vez de "quero atender bem", talvez acostumada com a lida diária de cidadãos humildes, humilhados cotidianamente, desqualificados de conhecimento, indefesos na valia dos seus direitos.

Saí de lá com uma gana enorme de contar para os quatro cantos do mundo a minha experiência, de reverberar para todos a lição que aprendi com o banco, qual seja, "como espantar clientes em três dimensões".

EPÍLOGO.

Nesta minha desastrosa jornada de correntista do banco do brasil, confesso a vocês que não passei dias felizes.

Deduzi que esse banco possui uma estrutura antiquada, medieval até, tanto no que respeita à sua infra-estrutura física de atendimento, tanto no que respeita (ou desrespeita?) na sua capacitação dos recursos humanos. Em verdade, não foi à toa que a centenária D. Canô foi contratada para ser a "garota (garota???) propaganda" da instituição, com todo o respeito que nós baianos devotamos à santo-amarense.

Passado o dramalhão, acordei no dia seguinte tomado de imensa felicidade: sonhei de madrugada que Papai Noel me dava de Natal um talão cheinho de cheques de transferência bancária, os famosos TBs.

No caminho do trabalho, flagrei-me cantarolando "jingle bells". E cantarolava com estilo, com muito estilo.

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