O termo BRIC é um acrônimo criado por Jim O’Neill, diretor de pesquisas
econômicas do Banco Goldman Sachs, para designar os quatro principais países
emergentes do mundo: Brasil, Rússia, Índia e China.
De acordo com seus estudos, baseados em estimativas de evolução dos mercados, da produção e da demografia, até 2050 o grupo possuirá mais de 40% da população mundial e um PIB conjunto superior a US$ 85 trilhões, não obstante os diferentes desafios políticos, sociais e econômicos de cada um deles.
Nesse sentido, a China deverá aumentar o papel do consumidor e reduzir os
gastos com investimentos estatais. Essas medidas são importantes para que
possa sustentar seu crescimento acelerado que há mais de 25 anos proporciona
uma média anual de 9% de expansão do Produto Interno Bruto (PIB) e que nos
últimos anos possibilitou a retirada de 200 a 300 milhões de camponeses de
uma miséria abjeta, transformando-os em operários. Ocorre que a China exerce
hoje um papel deflacionista extremamente importante na economia mundial.
Assim como a Inglaterra no século 19 ofereceu mercadorias baratas a todo o
mundo, a China desempenha hoje esse papel, permitindo que mesmo os
trabalhadores desempregados pela própria concorrência chinesa nos mercados
de manufaturados da Europa e dos Estados Unidos continuem a consumir
produtos, a partir de suas bonificações.
A Índia, por sua vez, precisa investir em infra-estrutura, ampliar seu
comércio internacional e diminuir a burocracia e corrupção. É fato, contudo,
que no início dos anos 90, o país se submeteu a uma onda de reformas
liberalizantes e hoje possui uma taxa de crescimento anual de 7%. Em razão
de seus investimentos na profissionalização de sua população, o país ocupou
espaço no setor de serviços de informática e hoje começa a ganhar terreno
também em setores industriais.
Em relação à Rússia, há necessidade de investir em fontes alternativas de
combustível a fim de diminuir sua dependência em relação ao petróleo. Porém,
é importante como fornecedora de matéria-prima e de produtora agropecuária,
o que se revela bastante estratégico, na medida em que lhe possibilitará
abastecer a grande população que envolve China e Índia.
Já o Brasil será primordial no grupo devido ao seu papel de grande
exportador agropecuário. A cana-de-açúcar e a soja produzidas no país serão fundamentais na produção de combustíveis como o etanol e o biodiesel. Tudo isso coloca o país em uma posição bastante confortável, pois o qualifica como fornecedor de
alimentos, matéria-prima e energia de que China e Índia necessitam.
No entanto, alguns analistas entendem que o Brasil não continuará como
membro do BRIC, dada a sua baixa taxa de crescimento econômico. Essa
ponderação é incorreta por desconsiderar que esses países estão em fases de
crescimento distintas. A China, por exemplo, passa pelo chamado crescimento
brown field, onde há tudo por fazer e construir no país.
O Brasil experimenta a fase do crescimento green field, em que o país já
conta com infra-estrutura, com uma população urbana e com uma classe média.
Por isso, não é provável que o país alcance as mesmas taxas chinesas. Na
realidade, o crescimento chinês de hoje foi vivenciado pelo Brasil ainda
entre as décadas de 40 e 80 do século XX, quando o país cresceu, em média,
7% ao ano. Portanto, o Brasil já teve sua fase brown field e, por isso,
compará-los levaria a conclusões equivocadas. O importante não é que o
Brasil cresça a taxas exponenciais, mas que seu crescimento seja uma
constante.
De fato, o Brasil apresenta deficiências educacionais, de infra-estrutura,
corrupção e gastos públicos. Na globalização, o papel da educação é
extremamente relevante, pois o alto nível de qualidade no ensino é condição
sine qua non para o país inserir-se na economia mundial de forma
competitiva. Além disso, o Brasil precisa investir em infra-estrutura para
viabilizar o crescimento e fazer reformas legislativas para imprimir maior
transparência na maneira em que conduz seus negócios.
Porém, desde a volta dos governos civis, em 1985, o país passou por inúmeras
reformas e resolveu três dos seus principais problemas: a inflação, a dívida
e a democracia. A inflação foi contida com o Plano Real em 1994, que
provocou uma queda inflacionária de 2.500% em 1993 para os 4,7% de hoje. A
dívida do governo caiu para 42,2% do PIB e, a despeito de ainda ser alta,
está atrelada ao real e não ao dólar. Por fim, a democracia, embora precise
ser amadurecida, já é um instituto sólido.
Todo esse contexto foi analisado em abril desse ano pela revista inglesa The
Economist, que considerou o Brasil com uma situação mais vantajosa ante a de
seus parceiros devido a três principais pontos:
a) o Brasil, onde 83% da população é urbana, a divisão entre campo e cidade
não é uma ameaça como na Índia e na China;
b) a democracia brasileira é multipartidária e está associada à liberdade de
expressão, o que ajuda o país a negociar mudanças sociais, ao contrário do
que ocorre na Índia e na Rússia;
c) o Brasil não possui um nacionalismo agressivo que, periodicamente, assola
os outros três países.
Diante dessas ponderações, aqueles que consideram o Brasil como um país
isolado dentro do BRIC estão enganados porque, além de todo o seu potencial
econômico, a sua condição de país onde o Estado Democrático de Direito é uma
realidade, coloca-o como esteio natural do grupo, capaz não só de mostrar
que é possível aliar crescimento e desenvolvimento com democracia, mas que
essa realidade é imprescindível para concretizar as expectativas que o mundo
todo passou a esperar de cada um deles.
* Juliana Girardelli Vilela é economista e advogada formada pela Pontifícia
Universidade Católica (PUC/SP) é especialista do Peixoto e Cury Advogados em
São Paulo
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